justiça
A rigor, a justiça está em dar/deixar a cada um segundo suas necessidades e esperar de cada um segundo suas possibilidades/capacidade. Trata-se, portanto, de dar/deixar a cada um o necessário para a satisfação de suas necessidades e esperar que cada um faça o que estiver ao seu alcance para que isto seja possível - busca-se deixar a felicidade ao alcance de todos. É a justiça baseada naquilo que cada ser humano mais se assemelha aos demais (o desejo de ser feliz e as necessidades) e no respeito às diferenças no tocante à capacidade de contribuir para o resultado coletivo. No campo dos desejos, não há justiça de fato, pois estes não têm limites e, portanto, não há como dar/deixar a cada um segundo seus desejos; na busca da justiça possível nas diferenças do querer e do poder, as necessidades devem prevalecer sobre os desejos - a satisfação dos desejos de um não pode implicar na insatisfação das necessidades do outro e nem comprometer a sustentabilidade da vida em geral. Com a evolução, haverá um tempo no qual os excessos no querer serão eliminados (os desejos das pessoas se limitarão às suas necessidades) e em que cada um fará naturalmente (por vontade própria) o que estiver ao seu alcance para que a satisfação de todos seja uma realidade. Só então haverá justiça realmente.
O ser humano tem um anseio natural por justiça e, para que ela venha a ser possível um dia, devem evoluir de mãos dadas: a moral, as leis, o poder de polícia e o judiciário. Para se ter a justiça possível no decorrer do processo evolutivo, é preciso que haja harmonia entre estes "pilares". Todo e qualquer descompasso existente entre eles será fonte de sentimento de injustiça.
Quando o homem está em
desacordo com a norma ele tende a
descumpri-la (ou a cumpri-la com contrariedade) e, portanto, o fato de
a
lei estar sendo cumprida não implica necessariamente que a
sociedade concorde com ela. Somente é legítima a
lei que
expresse a vontade da sociedade, que esteja de acordo com a moral
predominante.
Usar leis para promover a evolução retificando a
moral
predominante é querer evoluir pelo chicote, pela
tensão,
é não deixar fluir naturalmente o processo, o que
tende a
gerar sentimento de injustiça e a induzir à
formação de personagens.
Leis adequadas à sociedade propiciam a existência
de uma
sociedade naturalmente cumpridora das leis. As leis não
devem
ser feitas para o cidadão perfeito, pois ele não
existe
e, conseqüentemente, de alguma forma todos serão
fora-da-lei. O ser humano deve ter a perfeição
como
direção e não como obrigatoriedade.
Por outro lado, para que haja justiça o cumprimento da lei
deve
ser cobrado igualmente de todos e o julgamento deve ter a celeridade
necessária para que a pena tenha eficácia na
recuperação do infrator. Portanto, a lei deve
estar
coerente com a capacidade do policiamento e do judiciário de
exercerem com eficiência o seu papel, pois, caso
contrário, será fonte de injustiças.
São as seguintes as condições para que
uma lei seja boa:
-
Poder ser cumprida pela totalidade da sociedade. Se houver exceções a lei deve contemplá-las. A lei não deve ter o descumprimento como única alternativa para nenhum cidadão.
-
Deve estar de acordo com a moral das pessoas. O cumprimento da lei deve ser consensual (espontâneo) para a maioria absoluta da sociedade. Não deve ser fonte de estresse, de sofrimento.
-
Deve estar de acordo com a capacidade de policiamento e julgamento disponíveis.
-
A contrapartida exigida pela sociedade, em decorrência do descumprimento da lei, deve objetivar principalmente a recuperação do infrator, que não haja a reincidência. A contrapartida deve ser considerada apropriada (aceita naturalmente) por aqueles obrigados a prestá-las.
Quando
a lei é descumprida por uma grande parcela da sociedade o
problema está na lei (que não foi aceita ou
é
impossível de ser cumprida por estas pessoas) e
não na
sociedade. Quanto mais incompatível for a lei com a
sociedade,
mais severas têm que ser as penas para fazer com que elas
sejam
cumpridas e maior o descontentamento. Além disso, quando a
moral
da sociedade é permissiva e o policiamento e o
judiciário
são ineficientes, há um "incentivo" ao
descumprimento das
leis.
As pessoas querem justiça moral (ser justo e imparcial,
buscar o
bem coletivo) enquanto o sistema atual insiste em fornecer apenas a
justiça legal. Quanto maior a diferença entre os
dois,
maior a desilusão das pessoas com a justiça.